Grande

21 04 2024

O mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar.

O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar.

O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar.

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Carlos Drummond de Andrade





Viajar 4

19 07 2022

É frequente ouvirmos alguém afirmar que só viaja à noite, por ser “muito pau” aguentar dez ou doze horas a olhar pelas janelas, sentados em bancos incômodos, sem ver nada de importância, a não serem pastos, matos e morros longínquos. É que esses cavalheiros são daqueles de quem falam as escrituras: “oculos habent sed non vident“. E deles tenho pena.

Para quem sabe ver, não há paisagens monótonas. Numa campina verdejante onde pasta o gado, nos rápidos segundos que durou a visão, se soubermos ver, notaremos se os bois estão gordos, qual a raça predominante, divertimo-nos com o bezerrinho assustado pelo treme instintivamente o nosso pensamento vai para a fazenda em que passamos a infância, ou visita à estância de amigos, e à nossa memória acodem episódios relacionados com o que acabamos de ver. A paisagem é desoladora, só pedras e mato ressequido, mas tem, no alto de um barranco ou encosta empedrada cortada a prumo, um coqueiro esguio, ou elegante ipê coroado de ouro e pensamos na linda fotografia que poderíamos tomar…

Até o repugnante quadro  de uma rês morta e centenas de urubus, a se banquetearem uns, outros infartados, empoleirados nas árvores, é tema para uma série de divagações. De que teria morrido? Cobra? Erva? E figuramos o vaqueiro que, tendo visto de longe os tétricos necrófagos adejando em círculo, esporeia o cavalo para verificar, pesaroso, a perda, e depois or ao patrão dar a triste notícia nesse tom de mágoa, que conhecemos quando um vaqueiro fala da perda de uma cabeça de gado.

E enquanto a nossa fantasia trabalha, os quilômetros são vencidos e os minutos se passam sem que tenhamos tempo para nos aborrecer.  Até na monotonia das travessias marítimas temos como nos distrair e ilustrar, vendo surgir as nuvens de peixes voadores, os numerosos  golfinhos que afloram à superfície como se nadassem rolando sobre si mesmos, as gaivotas que adejam à volta do navio, ou o inesperado jato d’água de alguma baleia longínqua. E essas cenas nos ficam na memória, servindo mais tarde para tornar mais agradável a nossa conversação.

Estas considerações vieram-me de começo, quando ia dizer-lhes que a nossa viagem S. Francisco abaixo ia decorrendo sem que sentíssemos passarem os dias.

árvore no Inverno

Francisco Carvalho de Barros Júnior (Campinas, 14 de dezembro de 1883 — 1969) em  Caçando e pescando por todo o Brasil, 3ª série: no planalto mineiro, no São Francisco, na Bahia.

Francisco Carvalho de Barros Júnior foi um escritor e naturalista brasileiro que ganhou em 1961 o Prémio Jabuti de Literatura, na categoria de literatura infanto-juvenil.





Confronto

21 11 2020

Se alguém lhe fechar a porta, não gaste energias com o confronto ; procure as janelas.

Lembre-se da sabedoria da água : a água nunca discute com os seus obstáculos, contorna-os.

Água pura

Dalai  Lama





Ar

9 07 2014

Uma democracia esmagada faz jorrar esse “estado de guerra de todos contra todos” que é sempre o que sobra quando a política falha.

Portugal precisa de ar. Um compromisso nacional para rasgar uma janela nesta Europa que nos condena à anóxia. Ou nos unimos contra a pressão externa que nos sufoca, ou sucumbiremos numa sombria confirmação de que os “brandos costumes” não passam de um mito.

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Viriato Soromenho Marques